Vim saber ao que sabe o primeiro sabor de chuva deste ano. Vim saborear o cheiro a terra molhada e ao ar húmido. Vim deliciar-me com um café quente na primeira noite em que faz frio.
Saí de casa de cachecol ao peito e casaco de lã. O calor da roupa traz-me harmonia e sinto aquele prazer de Outono.
Refugio-me no jazz balanceante dos anos 60 que toca na velha telefonia do café. As mesas cor de café e o próprio café de travo amargo transportam-me para uma realidade onde só existo eu e os meus pensamentos.
As vozes ao fundo fazem-me crer que não estou sozinha. Mas hoje sinto-me só e, pela primeira vez, sabe-me profundamente bem. Faz-me bem.
É nesta solidão outunal que decido partir. Para um novo caminho que se desenha sinuoso mas aliciante e onde me espera a felicidade, uma outra felicidade.
A luz do candeeiro treme e sei que o mundo lá fora corre. Eu, aqui dentro, escondida entre o crepitar da lareira e o som da máquina antiga de café, páro. Páro para realizar que vou partir. E digo ao mundo hoje que vou partir.
Este partir desenha-se, agora, como uma força que me impele a sentir o frio. E, por isso...tiro o casaco, guardo o cachecol na bolsa e faço o caminho de volta para casa. O frio faz-me sentir que parti.