sexta-feira, outubro 26, 2007

Casa

Uma casa desconhecida; quiça, nunca antes tocada. Uma casa cujas paredes imaculadas contam segredos de outrora, falas silenciadas que escondem gritos abafados. Uma casa onde estou, despojada de minh'alma, onde me perco propositadamente para me encontrar, enfim, no meu corpo. Uma casa onde, a cada passo, descubro um pouco mais do mundo, um pouco mais de mim. Esta casa onde fico e te encontro, sentado numa poltrona, descansando. Fumas cachimbo e lês o jornal, de perna traçada olhas-me por cima do ombro. Aproximo-me a medo, com medo de retirar toda a pureza e o mistério que envolvem esta casa.

Pergunto-te, baixinho, quem eras...respondes, sussurando, sou eu, a tua casa...

E assim me apaixonei, por uma casa sem dono que me seduziu e a quem passei a pertencer. E assim amei África, casa desconhecida, nunca tocada, de contornos puros que escondem ditos e não ditos de gente que não pode dizer mais do 'sejam bem vindos à minha terra'.

Uma casa, África...

terça-feira, outubro 09, 2007

Homicídio

A janela está entreaberta. E a frescha minúscula exala uma brisa gélida, do tipo Outunal, que me arrepia e que se entranha no corpo, agora abandonado.

Ele olha para mim uma última vez, o seu olhar penetra na minha pele e sinto-o vaguear pelo meu interior, praticamente exposto. Ele acabará por sair, mais minuto, menos minuto, deixando-me para trás, destruída.

A porta bateu e ele, do lado de lá, deixa escapar um suspiro. O seu corpo trémulo é espelho das suas mãos ensaguentadas, do frio que sente, do suor que escorre na sua face. Todo ele é agora um misto de sensações, não de sentimentos.

Conforme se afasta, o meu corpo tende a arrefecer. Talvez a janela se tenha aberto mais um pouco ou então talvez seja a morte que chega, lentamente, com o frio.

Foi tudo medido ao pormenor. Em vez de me provocar uma morte rapida, ele escolheu o castigo extenso, tenebroso, lento, gélido. Talvez eu tenha merecido, o erro possivelmente foi meu. Deixar-me entregar desta forma.

Não se deve amar. Pelo menos, da forma como amei. Pois agora que ele já não me quer mais, foi como se me tivessem morto.

Um homicidio inigualavel, o homicidio de amor.

Deixo-me, então, invadir pelo frio causado pelo seu abandono, esqueço o sangue das suas maõs, o seu olhar invasivo, esqueço que sou e deixo-me ficar tal e qual ele também me deixou. Nos entretantos, espero um corpo quente que me acorde, de novo, para outro amor.